Foto 1 - Francisco Alexandre iniciou a maratona às 14:00h...
Foto 2 - ...e Fernandino Lopes encerrou-a às 03:40h
Eram 13,30h e já a Sede da Amigos do Concelho de Aviz – Associação Cultural, estava aberta para ultimar os preparativos da homenagem que aquela Associação pretendia fazer ao Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, recentemente falecido. À hora aprazada, 14 horas, deu-se início ao evento. A sala, decorada de modo simples mas condigna, apresentava uma mesa redonda para leitura onde um ramo de flores dava um ar de graciosidade, enquanto três fotografias do cartaz promocional deste evento, ladeavam a bandeira da ACA.
Na ocasião usou da palavra Francisco Alexandre, Presidente da Direcção da ACA que apresentou a razão para esta homenagem: tratar-se do Prémio Nobel da Literatura Portuguesa e como tal, entendeu a ACA que a melhor forma de homenagear o português distinguido – José Saramago – é lê-lo. O livro escolhido para esta leitura integral e em voz alta – Levantado do Chão – por ser aquele que o lançou como escritor e por ser um retrato fidelíssimo do nosso Alentejo.
Depois foi a vez do Vice-Presidente, José Ramiro, referir o lado antropológico e histórico, - sem dúvida - dos livros de José Saramago, sendo este um, dos que melhor ilustra este facto.
Começou finalmente a maratona de leitura em voz alta do livro “LEVANTADO DO CHÃO”. Eram exactamente 14:50h.
Não é fácil ler José Saramago. A pontuação é suigeniris, os discursos directos que não têm parágrafos, os períodos que, por vezes, são enormes cortam a respiração, mas nem isso esmoreceu o entusiasmo daqueles que se propuseram levar a bom porto esta iniciativa. Os capítulos foram caindo uns atrás dos outros. Uns mais demorados que outros, por maiores. A tarde nem dá por se passar. Os ouvintes seguem atentamente o que os outros vão lendo. Cada qual tem os seus afazeres. Há quem vá ler e depois vá tratar da sua vida. E não volte. E há quem vá ler, vá tratar de outros assuntos, como por exemplo ir às Marchas ao Maranhão e depois volte. E voltam a ler com o mesmo entusiasmo. A meio da tarde chegam os primeiros voluntários de Portalegre: a Professora Maria Albertina e o marido. Vêm expectantes. E leram: primeiro ela, depois o António Martins. Os “da casa” ouvem e esperam a sua vez. Lá mais para o fim da tarde, mais gente que vem de Portalegre com o propósito de fazer uma homenagem a alguém que, se calhar, nunca tinham pensado poder fazer: a professora Deolinda Milhano chega acompanhada pelo marido e nota-se-lhe a ânsia de querer entrar rapidamente naquele “jogo”. Quer ler. E lê. Pausadamente, como convém, para que as palavras, as sílabas, os parágrafos, sejam apreendidos. Mas antes ainda me segreda: vem aí um amigo meu. Foi erradamente ter ao Auditório…deve estar quase a chegar. E chega. Entra na sala. Reconheço-o. Companheiro de outras lides literárias. É o Matos Serra, capitão de Abril residente em Cabeço de Vide. Não o oiço ler, com muita pena minha. São horas de ir jantar que estas coisas também não se podem fazer de barriga vazia.
Regresso por volta das 22 horas. Na sala já se respira “Saramago” há muito tempo. Na Igreja Matriz o relógio vai marcando, cadenciado o tempo. As badaladas por vezes nem se ouvem. Elas são dadas com força mas a sala está absorta na história. Por ali vagueia, já há muito, o António Mau-Tempo, o do livro, o de Monte Lavre, porque o nosso, o cá de Avis, esse está a fazer as malas para ir passar umas férias à Tunísia. Pois que faça boa viagem que nós ficamos por cá com o António Mau-Tempo e seu pai João Mau-Tempo, de Lavre, mais, o Sigismundo Canastro, mais o Guarda José Calmedo e o Cabo Tacabo (cujo nome tanta dificuldade tinha em ser lido, não era Ana?), mais a Gracinda Mau-Tempo, mais o Manuel Espada, mais o cão Constante e ainda mais toda aquela gente que, graças a Saramago, povoa os nossos sonhos nessa tarde/noite/madrugada.
Alguém abre a porta de mansinho. Assusto-me. Penso que poderá ser o Cabo Tacabo ou mesmo o padre Agamedes que, agastado com esta homenagem, nos venha lembrar que Deus não se compadecerá daquela nossa heresia. Rodo o pescoço devagar e descanso ao ver que afinal quem entra é o José Ramiro, que como a Leonor Xavier, fôra às Marchas ao Maranhão e já regressara. Descanso o medo e embrenho-me de novo na história. A luta pelas oito horas está quase ganha. Mas ainda não está.
…Um noctívago, (já estamos para lá das três da manhã), passa lá fora, na Serpa Pinto (praça ou rua? Que importa?). Os passos são cadenciados e aproximam-se. Soam-me a algo de sinistro e tenho medo de novo. Será alguém que vem fazer o funeral do João Mau-Tempo? Há sempre alguém que lhe cheire a morte. Talvez seja o Padre Agamedes para lembrar um homem bom…Desta vez já não olhei para a porta. Olhei para os meus colegas da sala. Os resistentes… Concentro-me no que a professora Maria Antónia Oliveira lê. E ainda tem folgo para tanto…
Nunca pensei que houvesse tanta gente a assistir ao final do livro. Falta só já um capítulo. Somos seis, os resistentes ao sono a às dores de costas e pescoços.
Tem a honra de encerrar esta maratona o Fernandino Lopes. São três e meia da manhã acabadinhas de dar no relógio da Matriz. Fernandino diz umas palavras de circunstância antes de começar a ler. Está emocionado. A coisa correu bem e sente-se gratificado com a resposta dada a esta iniciativa em que foi ele a dar o pontapé de saída. E ataca o último capítulo. E chega ao fim e batem-se palmas. Batem palmas o Francisco Alexandre, o Fernandino Lopes, o José Ramiro, a Leonor Xavier, a Maria Antónia Oliveira e o Fernando Máximo. Dos 15 leitores da maratona estavam ali 6 leitores àquela hora tardia. Uma boa percentagem de resistentes: 40%! Se nos lembrarmos que 4 dos leitores não residem em Avis a percentagem sobe para uns admiráveis 55%!
Eram 03:40h do dia 11 de Junho. Tinham passado exactamente treze horas e quarenta minutos desde o início desta maratona de leitura. Missão cumprida!
Recorda-se o modo entusiasta como a Ana Martins leu e a “admiração” que expressou ao ler no livro uma referência a Montargil; o modo como Leonor Xavier se emocionou ao ler um fragmento que “mexeu” demais com ela por demasiado próximo da realidade por si vivida; o entusiasmo da pequena Carolina Oliveira e o modo ritmado como sua mãe, Maria Antónia Oliveira leu, apesar de nunca até ali ter lido Saramago e recorda-se, por fim o nome e as horas daqueles que disseram SIM à solicitação da ACA:
Francisco Alexandre e José Ramiro – palavras de abertura – 14:00h
Leitura do livro:
- FRANCISCO ALEXANDRE – 14:50H
- LEONOR XAVIER – 15:10H
- MARIA ALBERTINA DORDIO – 15:45H
- JOÃO MARTINS – 16:15H
- ANA BALÃO – 16:40H
- ANA MARTINS – 17:45H
- SILVIA FELIZ – 18:10H
- JOSÉ RAMIRO – 18:40H
- LEONOR XAVIER – 19:30H
- DEOLINDA MILHANO – 20:35H
- MATOS SERRA – 21:15H
- CAROLINA OLIVEIRA – 22:15H
- MARIA ANTÓNIA OLIVEIRA – 22:25H
- ANABELA CANELA – 22:45H
- ANA MARTINS – 00:20H
- MARIA ANTÓNIA OLIVEIRA – 01:15H
- FERNANDO MÁXIMO – 02:00H
- ANA MARTINS – 02.20H
- LEONOR XAVIER – 02:50H
- MARIA ANTÓNIA OLIVEIRA – 03:00H
- FERNANDINO LOPES – 03:30H
FINAL – 03,40H
Parabéns à ACA!